Para a história do problema da liberdade, a tradição cristã tornou-se o factor decisivo. Nós equiparamos quase automáticamente a liberdade ao livre arbítrio, ou seja, a uma faculdade virtualmente desconhecida para a Antiguidade Clássica[...] A razão para este facto perturbador está em que na Grécia como na Roma antigas, o conceito de liberdade era exclusivamente político, era a quinta-essência da cidade-estado e da cidadania. De tal modo assim era que a nossa tradição de pensamento político, iniciada com Paménides e Platão, foi fundada explicitamente contra essa polis e a sua cidadania. O modo de vida do filósofo era entendida como a antítese da bios politikos, o modo de vida político . A liberdade, o verdadeiro centro da política tal como os gregos a entendiam, era portanto uma ideia que, quase por definição, não entrava no quadro da filosofia grega. Só quando os primeiros cristãos, e S. Paulo em particular, descobriram uma espécie de liberdade que não tinha qualquer relação com a política, é que o conceito de liberdade pôde entrar na história da filosofia. A liberdade tornou-se um dos principais problemas filosóficos quando passou a ser vivida como algo que acontece na relação entre eu e eu-mesmo , fora das relações entre os homens. Liberdade e livre arbítrio tornaram-se conceitos sinónimos e a presença da liberdade era vivida em completa solidão. Hannah Arendt, Entre o Passado e o Futuro.
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