quinta-feira, 30 de junho de 2011

FLAUTA DE PÃ II

FLAUTA DE PÃ_PICASSO *
Somos a aventura e o amor,
a alegria e a dor...
o tempo que se mima a ele próprio,
como néctar que transborda em copo;
*
Somos a fragrância mágica
e o voo leve que nos encanta
como flauta de pã sedutora mas trágica
depois das vertigens que à vista levanta; 
*
Somos o destino do mundo
em lances onde o caos alastra profundo,
até aos gritos de dor em que a vida se apranta,
como serpente cravada na garganta;
*
Somos o riso que nos espanta,
e o fardo pesado que já se levanta,
e a altivez leve que em espiral circula,
secreta como a luz que a fecunda...
*
Somos vagas, navios, e portos,
núvens, faróis, e nunca prontos,
leveza de voos em rasgo de pássaros,
e até rios de pranto em vida de lázaros;
*
Somos o azar que nos envolve,
e a liberdade de emergir que nos acolhe,
mas também o grito que nos invade,
e a nostalgia que nos aflora à saudade...
*
Somos as máscaras do destino,
 véus do acaso em eterno desatino,
A vida jogada em azar cifrado,
o desejo do mais no efémero plasmado...
E, por fim, o nada de bronze, no voo sagrado!...


Véu de Maya

terça-feira, 28 de junho de 2011

DE CRISTAL É O MEU SILÊNCIO

                      

CASA AO LUAR_EDVARD MUNCH
*
Quero este silêncio de fogo
Que me incendeie as palavras
E as puxe para as estrelas
Como a paixão às rosas vermelhas;
*
 Quero este silêncio intenso
Que me oxigene as palavras
E as enlace às plumas do tempo
Por rotas de liberdade sagradas;
*
 Quero este silêncio de espanto
Que ao reflectir pelas estrelas
Volte de encontro às vidas terrenas
Até as curar de serem  pequenas;
*
E ficar assim-leve-num voo profundo!
A lançar afagos aos abismos do mundo,
Em contradança com os anéis do destino, 
 Baile de máscaras sublimes que visto,
Até ser de cristal o silêncio em que habito...
Véu de Maya

domingo, 26 de junho de 2011

A DANÇA DA VIDA
















MAS QUE BELA ADVERTÊNCIA DE NIETZSCHE?

INTERIOR COM DUAS MENINAS A DESENHAR_PICASSO

*****
Um artista capaz, ou um sábio, dá uma boa impressão quando exprime a sua altivez na arte e olha a vida com satisfação e segurança. Contrariamente, nada de mais lamentável do que um cordeiro ou um mestre-escola, quando deixam transparecer, com ar doloroso, que nasceram para outros destinos. O óptimo é inimigo do bom, e bom é possuir uma capacidade qualquer e agir em consequência disso: ter uma virtude no sentido renascentista.
Actualmente, onde quer que o Estado tenha uma enorme pança aparecem, em todos os domínios e em todas as especialidades, além dos trabalhadores propriamente ditos, representantes do trabalho-nomeadamente da banda dos sábios e dos literatos. Do lado das classes populares sofredoras estão sempre os inúteis, os palradores e os fanfarrões, em representação de reais sofrimentos; isto sem falar dos políticos profissionais, que dispõem de todas as comodidades, mas que representam todas essas misérias no Parlamento à força de brados.
A nossa vida moderna é extremamente dispendiosa, em virtude da multidão de intermediários. Numa cidade antiga, pelo contrário-e ainda em certas vilas de Espanha ou de Itália-cada um se defendia a si próprio[por vezes a pontapé] e ninguém concedia o menor crédito a este género de representantes e defensores.

Friedrich Nietzsche, Vontade de Poder, Vol I, Res Editora.